À mesa

Kisu: alta gastronomia japonesa de influência americana

Combinado 22 peças do Kisu - Foto: Sol Pulquerio

Por Bruno Albertim

É difícil até de acreditar, mas até a década de 1960 os sushis eram raros no Japão. Com as dificuldades de refrigeração, eram comuns apenas nas cidades costeiras, onde havia, claro, peixe fresco e disponível. Foi do outro lado do globo, com os imigrantes nipônicos radicados na Califórnia, que a iguaria se popularizou por estas bandas do mundo.

No Recife, o Kisu honra a origem nipônica e, sobretudo, o aporte norte-americano ao sushi como expressão da cultura planetária. Os americanos (grandes marketeiros que são) teriam, inclusive, criado o combo de sushis e sashimis em barcos cênicos utilitários que hoje, até nas churrascarias, chamamos de “combinados” – no Japão, essa combinação até pouco tempo não era anotada.

Combinado 22 peças do Kisu – Foto: Sol Pulquerio

De volta ao Recife: o Kisu honra a filosofia japonesa do frescor, mas adere à escola norte-americana de chefs autorais que deram alcances de alta gastronomia à cozinha nipônica (embora no Japão também haja lugares sofisticadíssimos em que se pagam pequenas fortunas por duplas de sushis). Não que o restaurante recifense exagere com ingredientes que valeriam ouro. Mas sua cozinha está longe da culinária japonesa mais ordinária e ancorada em atalhos como cream cheese e molhos excessivamente adocicados (sim, os americanos também são responsáveis pela vulgarização da cozinha milenar japonesa).

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Na cidade, sem errar, há dois ou três endereços com a elegância gastronômica do Kisu. Vejamos um dos combinados que o restaurante oferece nos serviços de delivery nesta quarentena. De salmão, atum fresco ou defumado (magnífico), peixe branco, os sashimis são até grosseiros na aparência, fatias generosas. Mas prove-os: é imediata a sensação de uma comida que parece ter feito, sem atalhos, o caminho do mar para a boca.

Os peixes são o ponto forte do Kisu – Foto: Reprodução

Já os sushis são delicados o suficiente para serem engolidos em uma só tacada – como se exige nas boas casas do Japão. E, além de nacos de peixes crus de sabores sinceros, estão ali algumas combinação com ingredientes que são fetiches da alta gastronomia. Num dos cominados, por exemplo, os bolinhos de arroz vêm cobertos por vieiras de coral, caras e de um sabor difícil de descrever, entre o marinho e o acetinado. Ou rolls (outra invenção californiana) recheados com atum e maionese trufada, uma mistura que provoca uma excitação quase elétrica no paladar. Um outro, de camarão com cerais adocicados. Mesmo os rolls de salmão com cream cheese (esse ingrediente tão infantil e enfadonho) são elegantes: o creme é em pouca quantidade, aportando untuosidade sem mascarar o sabor naturalmente sedoso do peixe.

Vale à pena também incorrer na cozinha quente, que vai além das chapas de pescados chamadas de teppan yakki. Provei uma porção de yahimessi, o risotinho com arroz japonês, com legumes cortadinhos e um rico molho que envolvia camarões, polvo e lulas: uma espécie de fundo concentrado acrescido com shoyu, numa profusão sedutora envolvendo lembranças das cozinhas da França e do Japão. Mal acabamos, temos já vontade de provar outra vez.

Yakimeshi Marineiro – Foto: Rafa Medeiros

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