Beyoncé é indiscutivelmente uma das maiores artistas da contemporaneidade. Na última sexta-feira (31), a cantora lançou seu novo álbum visual, “Black is King”, que resgata elementos da cultura negra e evidencia valores africanos. Durante o fim de semana e no decorrer desta segunda-feira (3), análises sobre o projeto ganharam as redes sociais. A grande maioria delas, é claro, demonstraram a importância da artista e o poder da sua voz nos temas ligados às questões raciais.
No entanto, um artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo reduziu a representatividade do trabalho encabeçado pela estrela internacional a uma manchete que associava os elementos visuais e figurinos usados no álbum à “glamourização” excessiva e aos efeitos especiais que hoje naturalmente integram o cinema e o audiovisual. De autoria da antropóloga Lilia Schwarcz, o texto recebeu inúmeras críticas desde a sua publicação, resultando, inclusive, em uma tentativa de pedido de desculpas em suas redes sociais. “Sei que todo texto pode ter várias interpretações e me desculpo diante das pessoas que ofendi. Não foi minha intenção”, escreveu a historiadora.
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Muitos famosos, aliás, estão entre as pessoas que criticaram o posicionamento de Lilia. A jornalista Maíra Azevedo, mais conhecida com Tia Má, apontou a falta de lugar de fala da antropóloga ao criticar um trabalho produzido por pessoas negras e que busca valorizar justamente a cultura afrodescendente. “O erro é uma mulher branca acreditar que pode dizer a uma mulher preta como ela pode contar a história e narrar a sua ancestralidade. A branquitude acostumou a ter a negritude como objeto de estudo e segue crendo que pode nos dizer o que falar sobre nossas narrativas e trajetórias”, escreveu em seu Instagram.
A cantora Paula Lima também questionou a crítica da colunista. “Beyoncé incomoda, né? Porque será?! Ser rainha, preta e dona do mundo deve doer demais para “pessoas” desavisadas! Que feio! Salve Queen B”, comentou. Na mesma linha, o ator Rafael Zulu destacou que é o momento de as pessoas negras também estarem em posições valorizadas e de prestígio social. “Eles nunca vão se acostumar. Pois eles que lutem, porque a gente chegou e do topo não vamos sair nunca mais”, disse.
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Considerada uma das principais cantoras brasileiras da nova geração, Iza também fez questão de demonstrar a importância do trabalho de Beyoncé, questionando a autoridade que a autora do texto teria, então, para diminuir o novo projeto da artista. “Meu anjo, quem precisa entender sou eu. Eu preciso entender que privilégio é esse que te faz pensar que você tem alguma autoridade para ensinar uma mulher negra como ela deve falar ou não sobre seu povo. Se eu fosse você (valeu, Deus), estaria com vergonha. Agora melhore!”, compartilhou a cantora em seus stories.
Outro artista que também foi incisivo em seu comentário foi o ator Ícaro Silva. “Você é uma grande, grande vergonha. Não somente para o Brasil e para o povo preto, mas para todos os povos aqui presentes. Não vejo por onde defender seu declarado racismo, sua arrogância branca elitista, em se dar ao direito não somente de reduzir uma obra ao nicho “antirracista” mas em acreditar que tem conhecimento antropológico sobre África”, analisou.
Em seu artigo, Lilia negativizou o fato de Beyoncé ambientar a história de “Black is King” em passagens que incluem, por exemplo, as savanas africanas. Vale-se, então, lembrar, que o álbum dialoga com o filme “O Rei Leão”, o qual se passa no deserto do continente. O novo trabalho da cantora, aliás, é produzido em parceria com o serviço de streaming da Disney, responsável pela famosa história de Simba e cuja a versão mais recente teve a voz da cantora na personagem de Nala, leoa que também protagoniza o enredo.
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A atriz Camila Pitanga, por sua vez, aconselhou a leitura do artigo compartilhado pelo advogado Thiago Amparo, também colunista da Folha de S. Paulo, que apresentou um contraponto à crítica de Lilia e analisou, assim, a produção audiovisual sob a ótica do afrofuturismo, que é a provável “escola” na qual o filme se baseou. “Podem negros(as) criar fábulas, como brancos sempre fizeram? Filme da Beyoncé, para mim, não apresenta África idílica. Me parece uma filme afrofuturista – que imagina o futuro afrocentrado”, escreveu, pedindo o diálogo no andamento da questão.
Podem negros(as) criar fábulas, como brancos sempre fizeram? Filme da Beyoncé, para mim, não apresenta África idílica. Me parece uma filme afrofuturista – que imagina o futuro afrocentrado. Admiro muito Lília. Não cancelemos, dialoguemos. Um fio👇🏾🧵https://t.co/Z5QgIkHW1e
— Thiago Amparo (@thiamparo) August 3, 2020
A imprensa tem que se ligar da nova realidade. No passado quando seus colunistas falavam besteira não existia um espaço para pessoas negras e periféricas questionarem, hoje nós temos voz pra criticar e isso tá assustando geral, deixa nomes famosos em choque. É só o começo 🔥
— Ale Santos (@Savagefiction) August 3, 2020
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